Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

De: alexandre@baptistaevasconcelos.com.br
Enviada em: terça-feira, 4 de junho de 2013 18:17
Para: 'gvlima@terra.com.br'
Assunto: Duas liminares concedidas

 

Vanderlei,

Mais duas liminares concedidas, no âmbito do STJ, desta feita do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho.

Acompanhe abaixo o andamento processual dos MS 20.178/DF e MS 20.187/DF tendo como autores Raimundo Ricardo de Oliveira e Manoel Genival Rodrigues, respectivamente, inclusive as decisões monocráticas.

 

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Superior Tribunal de Justiça

 

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 20.178 – DF (2013/0153977-8)

RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
IMPETRANTE : RAIMUNDO RICARDO DE OLIVEIRA
ADVOGADO : ALEXANDRE AUGUSTO SANTOS DE VASCONCELOS E OUTRO(S)
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA

 

DECISÃO

MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE LIMINAR. ANISTIADO POLÍTICO, EX-INTEGRANTE DA AERONÁUTICA. AUTORIZAÇÃO PELO MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA PARA ABERTURA DE PROCESSO DE ANULAÇÃO DA ANISTIA. DECURSO DE MAIS DE 5 ANOS DESDE A PUBLICAÇÃO DA PORTARIA ANISTIADORA ATÉ A PRETENSA REVISÃO DO ATO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. MS 15.346/DF, REL. MIN. HAMILTON CARVALHIDO, DJe 03.12.2010. PREPONDERÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA CONFIANÇA E DA SEGURANÇA JURÍDICA, PILARES DE FERRO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. PRESENÇA DE PERICULUM IN MORA E FUMUS BONI IURIS. MEDIDA LIMINAR DEFERIDA PARA DETERMINAR QUE A AUTORIDADE APONTADA COMO COATORA SE ABSTENHA DE PRATICAR QUALQUER ATO QUE IMPORTE NA SUSPENSÃO E/OU CANCELAMENTO DA ANISTIA CONCEDIDA AO IMPETRANTE, ATÉ FINAL JULGAMENTO DO PRESENTE MANDADO DE SEGURANÇA.

1. Trata-se de Mandado de Segurança com pedido de medida liminar impetrado por RAIMUNDO RICARDO DE OLIVEIRA, anistiado político, no qual aponta como autoridade coatora o MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA e, como ato coator, o despacho que autorizou a abertura de processo para anulação da Portaria anistiadora que o beneficiou.

2. Narra a inicial que o ex-militar foi declarado Anistiado Político por meio de Portaria1.617, de 28.11.2002, passando, desde então, a perceber a reparação econômica correspondente na forma de prestações mensais, permanentes e continuadas.

3. Aduz que, conquanto não tenha sido informado, nos últimos anos, de qualquer iniciativa da Administração para revisar ou anular a anistia concedida, em 15.02.2011, foi editada a Portaria Interministerial 134, do Ministro de Estado da Justiça e do Advogado Geral da União, criando o Grupo de Trabalho Interministerial com a finalidade de reexaminar as anistias embasadas na Portaria 1.104-GM3/1964, sendo que recentemente o Ministro da Justiça proferiu despacho autorizando a abertura de processo de anulação da portaria de anistia.

4. Sustenta que, passados mais de 5 anos a contar do primeiro pagamento da prestação mensal relativa à sua anistia política, estabilizou-se a relação jurídica com albergue constitucional do direito adquirido e da inviolabilidade do ato jurídico perfeito. Destaca que a possibilidade de revisão e eventual anulação da Portaria anistiadora sucumbe por força da decadência, operada nos moldes do disposto no art. 54 da Lei 9.784/99.

5. Alega que a plausibilidade jurídica do direito vindicado somada ao evidente risco na demora autorizam a concessão de provimento liminar para manutenção dos efeitos da Portaria concessiva de anistia política até o julgamento final do mandamus.

6. É o relatório. Decido.

7. De início, insta ressaltar que o objeto da impetração, no caso dos autos, cinge-se ao reconhecimento (ou não) de abuso ou ilegalidade postos no ato emanado da autoridade indicada como coatora, consubstanciado na autorização de abertura de processo para anulação da anistia concedida ao impetrante em 2002.

8. Nesse passo, vale lembrar que, embora a Administração Pública esteja adstrita à observância do princípio da legalidade, ex vi do art. 37 da Constituição Federal, seus atos devem se ater, igualmente, a outros princípios constitucionais, de igual relevância jurídica, notadamente o da segurança jurídica, corolário que é do Estado Democrático de Direito: a legalidade pode ser mortal, em certos casos, enquanto a juridicidade sempre abrirá as portas à Justiça, para lhe dar passagem, vestida com a armadura da Equidade.

9. Dest'arte, depreende-se que a aplicação do instituto da decadência em relação ao direito da Administração Pública de invalidar seus atos, ainda que eventualmente eivados de nulidade, encontra amparo no sistema jurídico contido na Constituição da República.

10. Deveras, se por um lado a Administração tem, por força do princípio da legalidade, o dever de invalidar os seus atos viciados, podendo fazê-lo por iniciativa própria ou por determinação judicial, por outro lado é de se considerar que o restabelecimento da legalidade deve ser sempre operado sem afetar a segurança jurídica, pois, caso contrário, sob o pretexto de se corrigir uma ilegalidade, estar-se-ia perpetrando uma outra ofensa ao ordenamento jurídico, e se pondo em movimento uma máquina de produzir discórdias.

11. Com efeito, a possibilidade de a Administração Pública revisar seus atos a qualquer tempo, ainda que sob a invocação do princípio da legalidade e da supremacia do interesse público, impacta a segurança jurídica e a própria moralidade administrativa, porquanto permite que o particular seja surpreendido pela invalidação de um ato muitos anos depois de sua prática, quando é justo pressupor-se que a situação jurídica nele espelhada achava-se sob o manto protetor das relações consolidadas.

12. A permissão de indefinida revisão ou revogação dos atos pela Administração Pública encerra perigo para a própria estabilidade das relações sociais, sendo os princípios da confiança e da segurança jurídica componentes da própria ética jurídica; é por tal razão que, no ordenamento jurídico brasileiro, a prescritibilidade é a regra, e a imprescritibilidade, a exceção.

13. A respeito, calha citar lição lapidar do Professor CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO:

O Direito propõe-se a ensejar uma certa estabilidade, um mínimo de certeza na regência da vida social. Daí o chamado princípio da segurança jurídica, o qual, bem por isso, se não é o mais importante dentre todos os princípios gerais de Direito, é, indisputavelmente, um dos mais importantes entre eles. Os institutos da prescrição, da decadência, da preclusão (esfera processual), do usucapião, da irretroatividade da lei, do direito adquirido, são expressões concretas que bem revelam esta profunda aspiração à estabilidade, à segurança, conatural ao Direito. Tanto mais porque inúmeras dentre as relações compostas pelos sujeitos de direito constituem-se em vista do porvir e não apenas da imediatidade das situações, cumpre, como inafastável requisito de um ordenado convívio social, livre de abalos repentinos ou surpresas desconcertantes, que haja uma estabilidade nas situações destarte constituídas (Curso de Direito Administrativo, São Paulo, Malheiros, 2010, p. 124).

14. Nesta esteira, firme de que o princípio da legalidade somente tem prevalência sobre o da proteção da confiança quando o administrado obtém vantagem por meios ilícitos, a jurisprudência desta Corte Superior assentou a orientação de que, após a edição da Lei 9.784/99, a invalidação dos atos administrativos sujeita-se ao prazo decadencial, nos exatos termos do art. 54 do referido diploma legal. A propósito:

MANDADO DE SEGURANÇA. MILITAR ANISTIADO. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO DE REVISÃO. DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. ORDEM CONCEDIDA.

1. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé e Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato (artigo 54, caput, e parágrafo 2o. da Lei 9.784/99).

2. Instaurado o processo de revisão de anistiado político após decorridos mais de sete anos da sua concessão e quase seis anos de recebimento da prestação mensal, permanente e continuada, resta consumado o prazo decadencial de que cuida o artigo 54 da Lei nº 9.784/99.

3. Conquanto se admita que o controle externo, oriundo dos Poderes Legislativo e Judiciário, não esteja sujeito a prazo de caducidade, o controle interno o está, não tendo outra função o artigo 54 da Lei 9.784/99 que não a de impedir o exercício abusivo da autotutela administrativa, em detrimento da segurança jurídica nas relações entre o Poder Público e os administrados de boa-fé, razão pela qual não poderia a Administração Pública, ela mesma, rever o ato de anistia concedida há mais de cinco anos.

4. Ordem concedida (MS 15.346/DF, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJe 03.12.2010).

15. No caso dos autos, a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida é perceptível primo ictu oculi, considerando que se trata de ato administrativo que tem mais de 5 anos de editado, de sorte que a invalidação da anistia política concedida ao ex-integrante dos quadros da Aeronáutica não se esquiva dos efeitos da decadência disciplinada no art. 54 da Lei 9.784/99; é cediço que não pode o administrado ficar sujeito indefinidamente ao poder de autotutela da Administração, sob pena de desestabilizar um dos apoios centrais do Estado Democrático de Direito, qual seja, o princípio da segurança das relações jurídicas.

16. Ademais, nem se diga que a autorização para abertura de processo de anulação da anistia não representa, por si só, abalo à segurança jurídica, uma vez que concretamente representa fato prospectivo de lesão ao patrimônio jurídico subjetivo do anistiado, quando já transcorridos anos e anos de sua perfectibilização.

17. O periculum in mora também está demonstrado, tendo em vista a iminência de anulação da Portaria anistiadora e da consequente suspensão dos pagamentos mensais da correlata reparação econômica, com evidente prejuízo à subsistência do impetrante e seus dependentes; isso sem mencionar o indubitável abalo à segurança, à tranquilidade, à própria paz de espírito daquele que por mais de 5 anos confiou na estabilidade da situação jurídica constituída expressamente pela Administração Pública.

18. Ante o exposto, satisfeitos, cumulativamente, os requisitos autorizadores, periculum in mora e fumus boni iuris, defere-se a medida liminar para determinar que a Autoridade impetrada se abstenha de praticar qualquer ato que importe na suspensão e/ou cancelamento da anistia concedida ao impetrante, até final julgamento do presente Mandado de Segurança.

19. Notifique-se a Autoridade apontada como coatora para, querendo, prestar informações no prazo legal. Após, abra-se vista ao Ministério Público Federal.

20. Publique-se; intimações necessárias.

Brasília, 22 de maio de 2013.

NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
MINISTRO RELATOR

 

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Superior Tribunal de Justiça

 

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 20.187 – DF (2013/0158982-6)

RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
IMPETRANTE : MANOEL GENIVAL RODRIGUES
ADVOGADO : ALEXANDRE AUGUSTO SANTOS DE VASCONCELOS E
OUTRO(S)
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA

 

DECISÃO

MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. PORTARIA QUE CONCEDEU ANISTIA POLÍTICA ANULADA, DE OFÍCIO, PELA ADMINISTRAÇÃO, MAIS DE 8 ANOS APÓS A SUA PUBLICAÇÃO. ALEGAÇÃO DE DECADÊNCIA. APARÊNCIA DE BOM DIREITO. PERIGO DA DEMORA. TUTELA MANDAMENTAL LIMINAR PROVISÓRIA DEFERIDA, MAS PARA VIGORAR ATÉ O JULGAMENTO DO MANDAMUS PELA TURMA.

1. É lição constante (e antiga) dos tratadistas de Direito Civil que o instituto da decadência serve ao propósito da pacificação social, da segurança jurídica e da justiça, por isso que, somente em situações de absoluta excepcionalidade, se admite a revisão de situações jurídicas sobre as quais o tempo já estendeu o seu manto impenetrável; o Direito Público incorpora essa mesma orientação, com o fito de aquietar as relações do indivíduo com o Estado.

2. No caso em apreciação, o impetrante é Anistiado Político, e sem nenhuma explicação ou justificativa para excepcionar a decadência ex ope temporis, a Administração tornou, de ofício, insubsistente um ato, de sua própria lavra, praticado há mais de 8 anos (anistia política do impetrante).

3. O fumus boni juris do pleito mandamental encontra-se demonstrado na aparente decadência do direito de a Administração revogar, de ofício, o seu ato, e o periculum in mora mostra-se na exclusão do impetrante do direito de perceber a sua pensão de Anistiado Político, com reflexos sobre os seus meios de subsistência pessoal e familiar.

4. Vislumbra-se, assim, à primeira vista, haver decaído a prerrogativa administrativa de revisão de ofício do ato, por isso que, ante tal evidência, concede-se a tutela mandamental de eficácia instantânea, para sustar os efeitos do ato revocatório, até o julgamento deste mandamus, pela 1a. Seção do STJ, que melhor dirá.

1. Trata-se de Mandado de Segurança com pedido de medida liminar impetrado por MANOEL GENIVAL RODRIGUES, ex-membro da Aeronáutica, no qual aponta como autoridade coatora o MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, e como ato coator a Portaria Ministerial 286, de 28.01.2013, que anulou o ato que concedeu a sua anistia política.

2. Narra a inicial que o impetrante foi declarado anistiado político pela Portaria 21, de 08.01.2004, do Ministro de Estado da Justiça, passando, posteriormente, a perceber a reparação econômica consistente em prestações mensais, permanentes e continuadas; isso foi há mais de 8 anos.

3. Aduz que, conquanto não tenha sido informado, nos últimos anos, de qualquer iniciativa da Administração para revisar ou anular a anistia concedida, em 15.02.2011, foi editada a Portaria Interministerial 134, do Ministro de Estado da Justiça e do Advogado Geral da União, criando o Grupo de Trabalho Interministerial com a finalidade de reexaminar as anistias embasadas na Portaria 1.104-GM3/1964, sendo que, recentemente, foi publicada a Portaria 286, que anulou a anistia do impetrante; este é o ato coator.

4. Sustenta que passados mais de 5 anos, a contar da declaração de sua anistia, estabilizou-se a relação jurídica sob o albergue constitucional do direito adquirido e da inviolabilidade do ato administrativo juridicamente perfeito. Destaca que a possibilidade de anulação da Portaria anistiadora sucumbe por força da decadência, operada nos moldes do disposto no art. 54 da Lei 9.784/99.

5. Alega que a plausibilidade jurídica do direito vindicado, somada ao evidente risco na demora, autoriza a concessão de provimento liminar para manutenção dos efeitos da Portaria concessiva de anistia política até o julgamento final do mandamus.

6. É o relatório. Decido.

7. De início, insta ressaltar que o objeto da impetração, no caso dos autos, cinge-se ao reconhecimento de abuso ou ilegalidade do ato emanado da autoridade indicada como coatora, consubstanciado na anulação da anistia concedida ao impetrante por meio da Portaria 21, de 08.01.2004.

8. Nesse passo, vale lembrar que, embora a Administração Pública esteja adstrita à observância do princípio da legalidade, ex vi do art. 37 da Constituição Federal, seus atos devem se ater, igualmente, a outros princípios constitucionais, notadamente o da segurança jurídica, corolário do Estado Democrático de Direito, como se sabe e amiúde se proclama.

9. Dest'arte, depreende-se que a aplicação do instituto da decadência em relação ao direito da Administração Pública de invalidar seus atos, ainda que eventualmente eivados de nulidade, encontra amparo na Constituição da República e no sistema das garantias subjetivas.

10. Deveras, se por um lado a Administração tem, por força do princípio da legalidade, o dever de invalidar atos viciados, podendo fazê-lo por iniciativa própria ou por determinação judicial, por outro lado é de se considerar que o restabelecimento da legalidade deve ser operado sem afetar a segurança jurídica, pois, caso contrário, sob o pretexto de se corrigir uma ilegalidade, estar-se-ia perpetrando uma outra ofensa ao ordenamento jurídico, qual seja, a violação da segurança jurídica das pessoas.

11. Com efeito, a possibilidade de a Administração Pública revisar seus atos a qualquer tempo, ainda que sob a invocação do princípio da legalidade e da supremacia do interesse público, ofende a segurança jurídica e a própria moralidade administrativa, porquanto permite que o particular seja surpreendido pela invalidação de um ato, muitos anos depois de sua prática; neste caso, mais de 8 anos após a sua edição.

12. A permissão de indefinida revisão ou revogação dos atos pela Administração Pública encerra perigo para a própria estabilidade das relações sociais, sendo os princípios da confiança e da segurança jurídica componentes da própria ética jurídica; é por tal razão que, no ordenamento jurídico brasileiro, a prescritibilidade é a regra, e a imprescritibilidade a exceção, somente atuando em casos prévia e expressamente definidos.

13. A respeito, calha citar lição lapidar do Professor CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO:

O Direito propõe-se a ensejar uma certa estabilidade, um mínimo de certeza na regência da vida social. Daí o chamado princípio da segurança jurídica, o qual, bem por isso, se não é o mais importante dentre todos os princípios gerais de Direito, é, indisputavelmente, um dos mais importantes entre eles. Os institutos da prescrição, da decadência, da preclusão (esfera processual), do usucapião, da irretroatividade da lei, do direito adquirido, são expressões concretas que bem revelam esta profunda aspiração à estabilidade, à segurança, conatural ao Direito. Tanto mais porque inúmeras dentre as relações compostas pelos sujeitos de direito constituem-se em vista do porvir e não apenas da imediatidade das situações, cumpre, como inafastável requisito de um ordenado convívio social, livre de abalos repentinos ou surpresas desconcertantes, que haja uma estabilidade nas situações destarte constituídas (Curso de Direito Administrativo, São Paulo, Malheiros, 2010, p. 124).

14. Nessa esteira, firme em que o princípio da legalidade somente tem prevalência sobre o da proteção da confiança quando o administrado obtém vantagem por meios ilícitos, a jurisprudência desta Corte assentou a orientação de que, após a edição da Lei 9.784/99, a invalidação dos atos administrativos sujeita-se ao prazo decadencial, nos exatos termos do art. 54 do referido diploma legal. A propósito:

MANDADO DE SEGURANÇA. MILITAR ANISTIADO. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO DE REVISÃO. DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. ORDEM CONCEDIDA.

1. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé e considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato (artigo 54, caput, e parágrafo 2o. da Lei 9.784/99).

2. Instaurado o processo de revisão de anistiado político após decorridos mais de sete anos da sua concessão e quase seis anos de recebimento da prestação mensal, permanente e continuada, resta consumado o prazo decadencial de que cuida o artigo 54 da Lei 9.784/99.

3. Conquanto se admita que o controle externo, oriundo dos Poderes Legislativo e Judiciário, não esteja sujeito a prazo de caducidade, o controle interno o está, não tendo outra função o artigo 54 da Lei 9.784/99 que não a de impedir o exercício abusivo da autotutela administrativa, em detrimento da segurança jurídica nas relações entre o Poder Público e os administrados de boa-fé, razão pela qual não poderia a Administração Pública, ela mesma, rever o ato de anistia concedida há mais de cinco anos.

4. Ordem concedida (MS 15.346/DF, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJe 03.12.2010).

15. No caso dos autos, a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida é perceptível primo ictu oculi, considerando que a invalidação da anistia política concedida ao ex-integrante dos quadros da Aeronáutica, mais de 8 anos após a edição do ato administrativo correspondente, não refoge aos efeitos da decadência disciplinada no art. 54 da Lei 9.784/99; é cediço que não pode o administrado ficar sujeito indefinidamente ao poder de autotutela da Administração, sob pena de desestabilizar um dos pilares de ferro do Estado Democrático de Direito, qual seja, o princípio da segurança das relações jurídicas.

16. O periculum in mora também está demonstrado, tendo em vista que anulação da Portaria anistiadora, com a consequente suspensão dos pagamentos mensais da correlata reparação econômica, representa evidente prejuízo à subsistência do impetrante e seus dependentes; isso sem mencionar o indubitável abalo à segurança, à tranquilidade, à própria paz de espírito daquele que, por mais de 8 anos, confiou na estabilidade da situação jurídica constituída pela própria Administração Pública.

17. Ante o exposto, satisfeitos, cumulativamente, os requisitos autorizadores, periculum in mora e fumus boni iuris, defere-se a medida liminar para sustar os efeitos da Portaria Ministerial que anulou a anistia política concedida ao impetrante, até o julgamento deste mandamus, pela 1a. Seção do STJ, que melhor dirá.

18. Notifique-se a Autoridade apontada como coatora para, querendo, prestar informações no prazo legal. Após, abra-se vista ao Ministério Público Federal.

19. Publique-se.

20. Intimações necessárias.

Brasília, 24 de maio de 2013.

NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
MINISTRO RELATOR

 

EDcl no MANDADO DE SEGURANÇA Nº 19.429 – DF (2012/0241455-2)

RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES
EMBARGANTE : UNIÃO
PROCURADOR : ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO – AGU
EMBARGADO : SEVERINO JOSÉ DE MEDEIROS
ADVOGADO : BRUNO DE ALBUQUERQUE BAPTISTA, ALEXANDRE AUGUSTO SANTOS DE VASCONCELOS E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO MANDADO DE SEGURANÇA. ANISTIA POLÍTICA. MILITAR. REPARAÇÃO ECONÔMICA. VALORES RETROATIVOS. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS PREVISTOS NO ART. 535 DO CPC. INCONFORMISMO DA EMBARGANTE. EFEITOS INFRINGENTES. INVIABILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS.

1. A atribuição de efeitos infringentes, em sede de embargos de declaração, somente é admitida em casos excepcionais, os quais exigem, necessariamente, a ocorrência de qualquer dos vícios previstos no art. 535 do Código de Processo Civil. Hipótese não-configurada.

2. No caso dos autos, não existem os defeitos apontados pela embargante, mas, apenas, entendimento contrário à sua pretensão recursal, de modo que é manifesta a intenção de rever todos os pontos analisados minuciosamente no aresto embargado. Assim, a embargante objetiva apenas o reexame da causa com a atribuição de efeitos infringentes ao recurso, o que é inviável em sede de embargos de declaração.

3. Embargos de declaração rejeitados.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:

"A Seção, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina, Ari Pargendler, Eliana Calmon, Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Meira.

Brasília (DF), 22 de maio de 2013.

 

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Postado por Gilvan Vanderlei
Ex-Cabo da FAB – Vítima da Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br