ALVÍSSARAS – Tutela concedida no TRF1 pelo Desembargador Federal – WILSON ALVES DE SOUZA ao ex-Cabo da FAB – Eulâmpio José da Cunha Filho, que teve a sua anistia anulada através do DOU nº 234, Seção 1, de 22/12/2020 e em breve estará voltando à folha de pagamento da Aeronáutica como antes.

 

Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 – DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA

 

PROCESSO: 1009296-29.2021.4.01.0000

PROCESSO REFERÊNCIA: 1011290-77.2021.4.01.3400

CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)

AGRAVANTE: EULAMPIO JOSE DA CUNHA FILHO

Advogados do(a) AGRAVANTE: EDMUNDO STARLING LOUREIRO FRANCA – DF20252-A,
                                                    JOAO CARLOS DE ALMADA SANTOS – DF40514-A

AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL

 

DECISÃO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por EULAMPIO JOSE DA CUNHA FILHO contra decisão da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal visando a suspensão dos efeitos da Portaria de Nº 3.428, de 18 de dezembro de 2020, e restabelecimento da condição de anistiado, com percebimento da respectiva prestação financeira e demais benefícios acessórios, entre os quais a assistência médico-hospitalar conveniada.

O Juízo a quo negou a tutela de urgência sob o fundamento de que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 817.338/DF (Tema 839), firmou tese no sentido da possibilidade de a Administração Pública instaurar procedimento de revisão de anistias conferidas a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria nº 1.104/1964, desde que observado o devido processo legal, o qual, aparentemente, teria sido respeitado.

Em suas razões o Agravante sustenta que, através da Portaria nº 3.076, de 16 de dezembro de 2019, foi instaurado procedimento de revisão da concessão da anistia política a ele concedida com fundamento na Portaria nº 1.104/GM-3/1964. Assevera que, após sua intimação e apresentação de defesa, concluiu-se pela anulação do ato – Portaria de nº 3.428, de 18 de dezembro de 2020.

Defende que foi considerado anistiado político há 16 (dezesseis anos) – portaria 1.720 de 08.07.2004, condição que obteve após regular processo administrativo de averiguação dos requisitos constitucionais para a efetiva concessão do ato. Lembra que, em 2011, dito ato foi revisionado, relatando que a Administração Pública teria firmado entendimento de que a Portaria nº 1.104, de 12 de outubro de 1964 seria ato de exceção, de natureza exclusivamente política. Assevera que, através da publicação da Portaria 3.076, de 16.12.2019, iniciou-se outro processo revisional, no qual não teria sido respeitado o contraditório efetivo e o devido processo legal. Pontua ter recebido uma notificação que entende ser vaga, constando apenas a informação da abertura de processo de revisão. Alega que na Portaria de instauração do procedimento não constam as razões para sua abertura, tampouco indícios ou elementos da ilegalidade do ato concessivo da anistia.

Sustenta que o procedimento revisional se fundamenta em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 817.338/DF, com Repercussão Geral.

Assevera, contudo, que não havia como se ter ciência do conteúdo decisório do julgado, RE 817.338/DF, considerando que ainda não havia sido publicado o acórdão.

Alega, por fim, que ainda haveria a possibilidade de alteração do teor do acórdão, através de recurso, bem como modulação de seus efeitos, mormente por ter havido grande divergência em seu julgamento – placar final de seis a cinco.

Eis o relatório.  

Decide-se.

O artigo 1019, I do CPC faculta ao relator conceder efeito ativo ao agravo de instrumento quando demonstrada, de plano, a coexistência de dois requisitos, quais sejam: a plausibilidade da fundamentação expendida e o risco de lesão grave ou de difícil reparação decorrente do cumprimento da decisão objurgada.

Todos os processos administrativos devem respeito aos ditames legais e princípios constitucionais, mais ainda tendo como objeto a anulação de anistia de ex-militar, após 16 (dezesseis) anos de sua concessão.

A Lei 9.784/1999 dispõe acerca das fases processuais e da necessidade de efetiva participação do interessado, a qual deve viabilizar-se através de comunicação processual. Vejamos, in verbis:

Art. 27. O desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado.

Parágrafo único. No prosseguimento do processo, será garantido direito de ampla defesa ao interessado.

Art. 28. Devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e os atos de outra natureza, de seu interesse.

Art. 38. O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo.

Art. 44. Encerrada a instrução, o interessado terá o direito de manifestar-se no prazo máximo de dez dias, salvo se outro prazo for legalmente fixado. (grifo nosso)

Compulsando os autos originários, verifica-se que na notificação enviada ao Agravante não consta especificamente o porquê de o ato de concessão de sua anistia estar sendo impugnado, constando genericamente a finalidade de se averiguar o cumprimento dos requisitos legais e constitucionais do ato concessório.

Dita notificação faz alusão à portaria instauradora, cujo fundamento, além do art. 10 da Lei 10.559/02 – que apenas confere competência à autoridade ministerial para proceder a dita revisão -, é o RE nº 817.338. Contudo, respectivo acórdão apenas foi publicado em 31.07.2020 – DJE 31/07/2020 – ATA Nº 122/2020, DJE nº 190, divulgado em 30/07/2020 -, tudo indicando que o inteiro teor não estava acessível na oportunidade da defesa administrativa do Agravante, em fevereiro de 2020.

Não se pode olvidar que dito recurso extraordinário ainda não transitou em julgado, pendentes recursos a serem apreciados, com possibilidade de ainda serem firmados limites temporais para a aplicação do julgado.

Aliado a isso, aparentemente o processo administrativo em questão não teve uma genuína fase instrutória. (ID 466090490, 466090495, 466424350 e 466424353 dos autos originários).

Portanto, há plausibilidade jurídica na alegação de ilegalidade na conduta da Agravada em anular a Portaria de concessão da anistia do Agravante em 18.12.2020, após 16 (dezesseis) anos do ato concessório, em 08.07.2004, vislumbrando-se a não observância do indispensável rigor procedimental.

O periculum in mora está presente na própria natureza da pretensão da parte sendo certo que, eventual deferimento tardio da presente medida poderá trazer consequências indesejadas à saúde do Agravante – atualmente com 77 anos e em tratamento de câncer de pele – mormente em meio à crise hospitalar que estamos vivendo devido à pandemia do coronavírus, tudo sem embargo de que se trata de prestação de caráter alimentar recebida há 16 anos.

Do exposto, concede-se a antecipação de tutela recursal suspendendo-se os efeitos da Portaria de Nº 3.428, de 18 de dezembro de 2020 e, consequentemente, restabelecendo-se a condição de anistiado político ao Agravante, com percebimento da respectiva prestação financeira e demais benefícios acessórios, entre os quais a assistência médico-hospitalar conveniada.

Determina-se o cumprimento da presente decisão em 5 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais).

Comunique-se.

Eventuais medidas executivas, inclusive de multa, devem ser requeridas perante o Juízo de 1º grau.

Registre-se a prioridade na tramitação conforme Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso).

Comunique-se o Juízo de primeiro grau, dando-lhe ciência da presente decisão.

Intimem-se os Agravados para que respondam, em 15 (quinze) dias (art. 1.019, II, CPC).

Publique-se.

BRASÍLIA, 30 de março de 2021.

 

WILSON ALVES DE SOUZA
Desembargador Federal Relator

 


Assinado eletronicamente por: WILSON ALVES DE SOUZA (Desembargador)

30/03/2021 14:03:37
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ID do documento: 107692582
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Para conhecer o inteiro teor original da decisão liminar, basta clicar sobre o Liunk abaixo:

DECISÃO LIMINAR-PJe_TRF1 – PROCESSO Nº 1009296-29.2021.4.01.0000 – Eulâmpio José da Cunha Filho

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Matéria enviada para publicação e divulgação pelo Escritório:

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Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Atingido pela Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br