min.humberto_martins2Ministro Humberto Martins é integrante da Primeira Seção/Segunda Turma do STJ.

(A Primeira Seção do STJ é composta pela Primeira/Segunda Turma especializada em matérias de direito público.)

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MANDADO DE SEGURANÇA Nº 18.320 – DF (2012/0051969-7)
RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS
IMPETRANTE : JOSÉ BENEDITO GUIMARÃES
ADVOGADO : BRUNO BAPTISTA E OUTRO(S)
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. CABO DA AERONÁUTICA. ATO DE ABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEBATE SOBRE DECADÊNCIA. FUMAÇA DO BOM DIREITO. RISCO DE MANTENÇA. PERIGO NA DEMORA. PROTEÇÃO CONTRA SUSPENSÃO DE EVENTUAIS EFEITOS FINANCEIROS E CONEXOS POR REVISÃO ATÉ O TERMO DO WRIT. PRECEDENTES. LIMINAR DEFERIDA.

DECISÃO

Vistos.

Cuida-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por JOSÉ BENEDITO GUIMARÃES, com fulcro no art. 105, I, “b”, da Constituição Federal, contra ato alegadamente coator do MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, que publicou despacho autorizando a abertura de processo administrativo de revisão da anistia política.

O ato apontado como coator é o Despacho MJ n. 157, publicado no Diário Oficial da União de 1º.2.2012 (e-STJ, fl. 33), do qual foi cientificado por meio de intimação (e-STJ, fl. 34).

O impetrante argumenta que o seu ato de anistia política (Portaria n. 176, de 29.1.2004) foi publicado no Diário Oficial da União em 2.2.2004 (e-STJ, fl. 51).

Na sua petição inicial (e-STJ, fls. 1-29), defende que o ato de anistia não pode ser revisto administrativamente porquanto estaria coberto pelo manto protetivo da decadência, tal como previsto no art. 54 da Lei n. 9.784/99.

Também alega que a postulada revisão afeta a segurança jurídica. Descreve o caso da Portaria n. 1.104/GM3/64.

Requereu a concessão de medida liminar, inaudita altera pars, sustentando a existência e a configuração dos requisitos legais. Pediu que o ato seja suspenso ou anulado tão somente até o deslinde do mérito.

No tocante ao fumus boni iuris, justifica que o tema da decadência mostrar-se-ia evidente e límpido, iluminando a liquidez e certeza.

Em relação ao periculum in mora, protesta que a remuneração possui caráter alimentar e, portanto, a sua mediata interrupção coloca em risco a sua sobrevivência.

É, no essencial, o relatório.

A concessão de liminar sem a oitiva da autoridade apontada como coatora é medida excepcional que somente se justifica ante a existência cristalina dos requisitos jurídicos autorizadores. Tais requisitos devem estar demonstrados previamente, já que a via mandamental não comporta instrução probatória.

No caso concreto, deve ser concedida a liminar pleiteada.

O pedido não se confunde com o mérito, e o pleito de liminar não se mostra satisfativo. É possível conceder a liminar para que o ato reputado como coator seja suspenso, até que o exame de mérito defina se deve ser ele anulado ou não.

Passo à fumaça do bom direito.

A Primeira Seção firmou sua jurisprudência no sentido de que os writs contra a Portaria Interministerial n. 134/2011, bem como contra a Portaria Interministerial n. 430/2011, configuravam impetrações contra lei em tese.

Aplicava-se, portanto, o teor da Súmula 266/STF.

Todavia, a polêmica começou a se corporificar no tocante aos atos administrativos de abertura dos processos de revisão das anistias políticas.

Algumas decisões perfilharam o entendimento de que estava a se tratar do mesmo tema derivado – impetração contra a Portaria n. 134/2011 – e que a Administração Pública não poderia ser obstada na sua sindicância interna da legalidade dos seus atos.

Contudo, outros ministros têm esposado o ponto de vista de que é cabível a concessão da liminar para suspender qualquer ato de cassação da anistia política até o debate final acerca do mérito da impetração. O debate acerca da interrupção do prazo decadencial – com base no art. 54, § 2º, da Lei n. 9.784/99 – será o centro da futura querela jurídica.

Logo, deve haver a ponderação de possibilidades, como assaz ocorre quando se examina matéria jurídica de maneira perfunctória.

O ato de anistia política foi publicado há mais de cinco anos, como comprovam os autos. Inicialmente, mostra-se clara a aplicação do art. 54, caput, da Lei n. 9.784/99:

“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANISTIA POLÍTICA. REVISÃO DO ATO. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. OCORRÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. SEGURANÇA CONCEDIDA.

1. O impetrante, sustentando a ocorrência de decadência administrativa, se insurge contra ato que determinou, em 14/7/10, a instauração de processo administrativo para rever sua condição de anistiado político, reconhecida na Portaria 2.791, de 30/12/02, do Ministro de Estado da Justiça.

2. Nos termos do art. 54, da Lei 9.784/99, “o direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados“.

3. A regra prevista no parágrafo primeiro do art. 54 da Lei 9.784/99, no sentido de que, no caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento, pressupõe que esse pagamento tenha sido efetuado no tempo devido. Em se tratando de anistia política, o art. 18 da Lei 10.559/02 determina o prazo de 60 dias para que os pagamentos sejam efetuados.

4. No caso dos autos, não obstante o impetrante tenha sido declarado anistiado político em 2002, até a presente data o benefício da prestação mensal continuada não foi implementado.

Dessa forma, a inércia da Administração em iniciar os pagamentos devidos ao impetrante não pode resultar na postergação do termo inicial do prazo de decadência previsto no art. 54 da Lei 9.784/99.

5. Segurança concedida.”

(MS 15.432/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 23.2.2011, DJe 11.3.2011.)

Não é possível, no presente momento, determinar com precisão que os argumentos a favor da interrupção do prazo sejam preponderantes e límpidos.

Logo, do cotejo entre os argumentos, emerge que o razoável é conceder a liminar para suspender os efeitos da Portaria ou do ato de abertura de processo administrativo.

Visualizo, como explicado, o fumus boni iuris.

Passo ao perigo na demora.

Resta configurado que o dano da interrupção da prestação mensal ao impetrante será maior do que a sua manutenção até o termo final do debate jurídico relacionado com a juridicidade dos atos de revisão da anistia política.

Cabe anotar que são plausíveis os riscos em sua sobrevivência e, portanto, resta configurado o periculum in mora.

Ademais, friso que a concessão parcial da liminar já está sendo deferida, como aduzido anteriormente.

Nesse sentido, em relação à abertura de processo administrativo:

MS 17.714/DF, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, publicado no DJe em 24.10.2011, MS 17.674/DF, publicado no DJe em 14.10.2011; MS 17.481/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, publicado no DJe em 22.8.2011; MS 17.698, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, publicada no DJe em 19.10.2011; MS 17.929/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, publicado no DJe em 9.12.2011.

Como indica o Min. Cesar Asfor Rocha em liminar concedida em caso similar “as alegações jurídicas trazidas pelo impetrante são relevantes e o periculum in mora encontra-se presente, tendo em vista a possibilidade da suspensão das prestações mensais, de natureza alimentar, decorrentes da anistia ” (MS 17.714/DF, publicado no DJe em 24.10.2011).

Ou, ainda, como menciona o Min. Arnaldo Esteves Lima: “o impetrante apresenta ponderáveis argumentos no sentido de que teria ocorrido a decadência administrativa, em razão do decurso do prazo de 5 (cinco) anos previsto no art. 54 da Lei 9.784/99 ” (MS 17.481/DF, publicado no DJe em 22.8.2011).

Ante o exposto, concedo a liminar pedida para suspender qualquer ato de interrupção dos efeitos financeiros e conexos – assistência médica, por exemplo –, bem como de cancelamento da anistia política do impetrante.

Anoto que não se trata – no presente momento – da decretação da anulação do processo de revisão da anistia política, cujo exame de juridicidade será realizado ao tempo da apreciação de mérito.

Nos termos da nova legislação referente ao mandado de segurança, Lei n. 12.016, de 7.8.2009, art. 7º, determino que se notifique a autoridade cujo ato foi arrolado como coator na petição inicial, MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações.

Determino também que se dê ciência do feito à Advogacia-Geral da União, órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito.

Após, nos termos do art. 12 da Lei n. 12.016/09, determino que sejam remetidos os autos ao Ministério Público Federal para emitir parecer, no prazo improrrogável de 10 (dez) dias.

Com ou sem o devido parecer do Ministério Público, retornem os autos conclusos, para a decisão, nos termos do parágrafo único do art. 12 da Lei n. 12.016/09.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília (DF), 20 de março de 2012.

MINISTRO HUMBERTO MARTINS
Relator

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Clique no número do processo para buscar o Inteiro Teor da Decisão Monocrática:

1 – MS 18.320-DF (2012/0051969-7)


Fonte: Baptista & Vasconcelos Advogados Associados
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Postado por Gilvan Vanderlei
Ex-Cabo da FAB – Vítima da Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br